Na Escola Estadual Esmeraldo Soares Tarquínio de Campos Filho, localizada em São Vicente, cerca de 40 estudantes participam, desde o ano passado, do projeto “Capoeira Inclusiva – Ritmo, Corpo e Inclusão”, que promove a autoestima e senso de pertencimento entre alunos com e sem deficiência, por meio da prática adaptada da capoeira.
A ideia do projeto partiu da professora Luciana Franco, que atua na sala de recursos da unidade e também leciona literatura. A proposta surgiu após uma oficina em que os alunos foram desafiados a transformar textos literários em expressão corporal. O entusiasmo gerado pela atividade inspirou a criação do projeto, que hoje conta com a colaboração voluntária de João Miguel Macedo, ex-aluno da escola, estudante de educação física e mestre de capoeira.
“A capoeira transforma as vidas, ajudando na coordenação motora, disciplina, autoestima e, principalmente, no respeito entre os alunos. Para mim, a capoeira é tudo de bom que eu tenho na minha vida. Não é apenas uma arte. Ela educa, inspira e forma grandes cidadãos”, afirma João Miguel, conhecido como Mestre Samurai.
As aulas ocorrem às segundas e quartas-feiras, das 12h às 12h50, no contraturno escolar. São atendidos 40 alunos por turma, dos quais 15 são estudantes elegíveis à sala de recursos, incluindo crianças com deficiência e transtorno do espectro autista (TEA). O projeto também envolve estudantes não elegíveis à educação inclusiva, promovendo convivência e empatia.
O diretor da escola, professor João Henrique Vilani, conta que “desde a implantação do projeto, alunos com deficiência passaram a participar com mais entusiasmo das atividades físicas, demonstrando avanços em habilidades sociais, interação e senso de pertencimento”.
Inclusão e alegria
A mãe do aluno Pyetro Kruysboom dos Santos, Letícia dos Santos Silva, conta como o projeto tem feito diferença na vida do filho, que é autista: “Ele está se reencontrando na capoeira. Conta os dias para a próxima aula. Antes, não tínhamos tempo para levá-lo a uma atividade assim. Agora, ele chega mais cedo para a capoeira e depois já entra para a aula. Isso ajudou muito na rotina e na alegria dele. Sou muito grata à escola e a todos os envolvidos”.
O próprio Pyetro, de 11 anos de idade e aluno do 6º ano, confirma o entusiasmo com as aulas e já faz planos futuros. “Eu gosto muito das aulas de capoeira, eu consegui novos amigos, eu até consegui fazer uma ponte! Um dia, vou ser diretor da escola”.
Renan Rodrigues Florentino, de 13 anos de idade, está matriculado no 8º ano e reconhece a capoeira como ferramenta de apoio emocional: “Às vezes, quando não estou bem, vou para a aula e me alegro. A capoeira me deu uma família. Quando estou na roda, sinto uma energia maravilhosa”.
Adaptação das aulas
O diretor João Henrique Vilani afirma que as atividades da capoeira são adaptadas de acordo com as habilidades motoras e cognitivas de cada estudante, com o uso da cadeira de rodas, recursos visuais para orientar os movimentos e, quando necessário, utilização de sinais táteis.
“Esses elementos diferenciam o projeto de uma aula de capoeira tradicional, que geralmente pressupõe maior autonomia motora e sensorial dos participantes”, explica o diretor. “Como o projeto é integrado às atividades da Sala de Recursos Multifuncionais, isso significa que ele é planejado em conjunto com a nossa professora especializada na educação de alunos com deficiência. Isso garante um olhar mais cuidadoso para as potencialidades individuais dos estudantes”, continua Vilani.
Além das rodas de capoeira, o projeto inclui:
- Musicalização com instrumentos como berimbau, atabaque e pandeiro;
- Cantigas;
- Contação de histórias da capoeira;
- Movimentos básicos adaptados, respeitando os limites físicos de cada aluno.
“Essas atividades ampliam as formas de participação, para que mesmo estudantes com menor mobilidade ou com deficiência intelectual possam se expressar e se envolver”, acrescenta o professor de capoeira e ex-aluno da unidade, o João Miguel.
Capoeira como esporte, cultura e respeito à diversidade
Além de movimentar os corpos, a capoeira também ensina história, música, expressão corporal e, sobretudo, respeito à diversidade.
O aluno Aldo Dantas Romares Neto, de 13 anos de idade e matriculado no 8º ano, diz que as aulas de capoeira abriram espaço para que ele tenha ainda mais orgulho de suas raízes: “A capoeira está no meu sangue, no meu DNA. Gosto muito da parte dos instrumentos. Me divirto bastante, fiz amigos e vou honrar o nome do meu mestre”.
Renan e Aldo, inclusive, ajudaram o professor João Miguel na montagem do berimbau que é utilizado durante as aulas.
Para a escola, o maior ganho tem sido ver alunos interagindo com mais empatia. “Os alunos não elegíveis à educação inclusiva entendem e respeitam as diferenças, enquanto os alunos com deficiência estão mais sociáveis e participativos. Isso é educação inclusiva acontecendo de verdade”, completa o diretor João.